sábado, 11 de junho de 2011

Mãe Bela, Mãe Fera, Marta Lagarta, 2010, ilustração Sami e Bill, Ed. Prumo

Os livros de literatura infantil estão cada vez mais graficamente impactantes. Algumas escritoras (e escritores) têm percebido com muita acuidade o perfil de leitora (e leitor) potencial, imerso em um mundo no qual os apelos visuais, estéticos, muitas vezes sobrepõem-se ao ético. O que não acontece com o livro de Marta Lagarta que busca coordenar os elementos estéticos e éticos e trazer para o seu leitor uma literatura divertida, reflexiva, dialética.

Em Mãe Bela, Mãe Fera, a autora nos dá uma ideia do que representa a mãe real, aquela que acalenta e ao mesmo tempo repreende, desmitificando a idealização da mãe forjada pelo discurso da modernidade que vincula a maternidade a signos que evocam bondade, generosidade, candura, entre outros. No livro de Lagarta, escrito com fonte grande e arredondada, a mãe que se apresenta é “maga amarga” e “fada açucarada”, “grita descontente” e “brinca sorridente”, “balanço que vai e vem” e “tombo também”, ela concentra ao mesmo tempo alegria e tristeza para o filho. Daí o mote que se repete ao longo do texto: “como pode ser assim ora boa ora ruim?” Se é verdade o que as teóricas e teóricos da literatura infantil apontam, inclusive Regina Zilberman, uma das estudiosas deste gênero, ao lado de Nelly Novaes Coelho, Marisa Lajolo e outras, de que o adulto escreve para a criança que ele inventa, da mesma forma podemos dizer que o escritor também se inventa, enquanto adulto, para a criança. Neste caso, em relação ao texto em questão, é a figura da mãe, a sua representação, que é enfatizada para o leitor-criança, mostrando-se que a maternidade não é uma divinização da mulher, mas incorpora a sua humanidade com toda a sua complexidade. Se o ser humano é caracterizado pelo conflito diante de si e do mundo, a maternidade não poderia escapar a essas tensões próprias da condição humana porque, ao ser assumida, acaba fazendo parte dela.

“Minha mãe tem tantos jeitos
Que é difícil entender
Uma hora ela é um modo
Mas depois deixa de ser”


Apesar de ser escrita pelo adulto, a voz narrativa é da criança, da filha, que vê alternando-se em seu cotidiano “a mãe semente” e a “mãe serpente”. Com este recurso, a transferência é imediata porque dá-se pelo processo de identificação da leitora (ou leitor) com a voz narrativa, as duas possui o mesmo status. O texto utiliza a forma em verso para dar ritmo a leitura, imprimindo-lhe ludicidade durante o fluxo da narrativa e reflexividade através dos versos repetidos ao longo do texto: “como pode ser assim ora boa ora ruim?”A dúvida suposta decorre da ideia de que a mãe deveria ser sempre boa? De onde vem esse imaginário? Por que esta imagem é internalizada a ponto de causar conflito? Estariam nos contos de fada? Se observarmos, a madrasta nas histórias infantis carrega sentidos associados à maldade, enquanto a mãe, em geral biológica, antagonicamente, evoca bondade, o que certamente pode ajudar a construir a representação da mãe associada à suprema benevolência. Quando a mãe escapa a essa figurativização, ela é imediatamente chamada de “madrasta”, como se fosse uma impostora. Existe também uma representação de maternidade que se relaciona ao cristianismo, na figura da Virgem Maria, o que contribui muito para a visão sublime de mãe, principalmente em países de colonização ibérica.

O texto de Marta Lagarta, que já traz poesia em seu próprio nome, opera com elementos já sedimentados pela cultura, destaque para o maniqueísmo bem versus mal. No entanto, as duas forças antagônicas não estão separadas do sujeito, ao contrário, faz parte dele e desta forma a história provoca uma fissura na base do pensamento que separa o sujeito bom do mal como se fosse possível para uma pessoa, ao longo de sua existência, ser 100% boa ou 100% ruim.
“Ora boa ora ruim
Feito história encantada
Eu agora chego ao fim:
mamãe é conto de fada!”

Além do aspecto escrito, faz parte dos estudos da literatura infantil, a análise das imagens e a relação com a narrativa. Os ilustradores Sami e Bill trazem formas humanas – da mãe e da filha – predominantemente circulares, evocando acolhimento, graciosidade, o que parece trair a concepção dialética do texto escrito, mas a circularidade das formas é proposital e tem mais a ver com a recepção do leitor, já que as formas arredondadas são mais atraentes do que as angulares. No entanto, as formas não são muito harmônicas, partes do corpo são desproporcionais, dando maior “movimento” à imagem, uma forma inteligente de inserir dinamicidade ao texto. As cores, predominantemente quentes (amarelo e vermelho), tomam toda a página (o texto verbal é escrito sobre o cenário), contribuindo para maior adesão da leitora (leitor) ao texto.
Mãe bela, mãe fera é um exemplo de literatura que se afasta às narrativas pedagogizantes que assolam a literatura infantil. É criativa, colorida, lúdica, inteligente e reflexiva.



A Ilha Perdida, Maria José Dupré, 1973

Na fazenda do Padrinho, perto de Taubaté, onde Vera e Lúcia gostavam de passar as férias, corre o rio Paraíba. Rio imenso, silencioso e de águas barrentas. Ao atravessar a fazenda ele fazia uma grande curva para a direita e desaparecia atrás da mata. Mas, subindo-se ao morro mais alto da fazenda chamavam de Ilha Perdida. Solitária e verdejante, parecia mesmo perdida entre as águas volumosas. (Dupré, 1973, p. 1)

Estranhei quando recebi, das mãos do vendedor, o livro de Maria José Dupré: maior, colorido e em papel couché, o livro parecia outro, muito diferente daquele publicado nos anos 70 e ao qual tive acesso quando estudante. De qualquer sorte, o acolhi como se acolhe a memória ou os prazeres que ela evoca. Foi o primeiro livro que li na escola e que (finalmente) a professora acertou. E como era difícil acertar. Naquele tempo, a leitura dos clássicos era imprescindível para alguns professores, como se nós leitores tivéssemos saído dos romances do século XIX, em que as crianças lêem desde a mais tenra a idade os clássicos. De onde uma boa parte veio, inclusive eu, a leitura de livros não era muito freqüente, muito embora meus pais fossem leitores ávidos de jornais. Os livros circulavam, mas eram poucos e a televisão já havia ocupado os nossos lares. Fui uma leitora ávida de filmes, os clássicos, que passavam à tarde na televisão.

Na escola, a professora indicou A Ilha Perdida e comecei a gostar de literatura, muito embora não fossem os “clássicos”. Li coleções de livros escritos para adolescentes, do tipo mistério e detetivescos, como Os Seis e Diana (não me recordo os detalhes), mas eram livros que eu lia, mas não me recordo de uma história deles. Aconteceu o mesmo, mais tarde, com os livros de Sidney Sheldon, li vários, mas não me lembro de nenhum deles.

No entanto, A Ilha Perdida permaneceu e tornou-se referência para mim quando o assunto é prazer em ler. O livro narra a história de uma ilha misteriosa e que por guardar tanto mistérios, cai na curiosidade de Eduardo e Henrique (por sinal, nomes do meu pai e do meu tio), dois meninos que eram primos de Quico e Oscar, filhos do Padrinho, e que nas férias iam para a fazenda. Havia também Vera e Lúcia (esta, minha xará), mas apesar do romance começar com a voz narrativa se dirigindo a elas, quase não aparecem ao longo do texto. Os protagonistas são Eduardo e Henrique. Talvez fosse ainda arriscado apresentar um romance para adolescentes em que as protagonistas fossem meninas aventureiras, desafiadoras, meninas que ultrapassassem os limites impostos pela obediência paterna, na figura do Padrinho. Do ponto de vista ortodoxo de gênero, esse papel caberia aos meninos, o que de fato acontece. Eduardo e Henrique atravessam o rio e conhecem a Ilha. A escritora, com maestria, consegue fidelizar o seu leitor desde o início, aguçando a sua curiosidade e conduzindo-o e transportando-o imediatamente para o texto. O leitor é o terceiro tripulante na viagem, além dos dois meninos, que testemunha as peripécias dos personagens, suas dores e alegrias quando se veem sozinhos na Ilha. O retorno à fazenda foi interrompido por uma tempestade, levando-os a permanecerem mais tempo do que planejado na incógnita ilha. Nada mais emocionante do que acompanhar as descobertas dos meninos, não só em relação a Ilha, mas sobre a vida, já que precisam lidar com os medos e ter que superá-los. A Ilha se apresenta como metáfora do mundo, desconhecido para os adolescentes que, muitas vezes longe do adulto, ou dos familiares, precisam interagir com ele, conhecendo-o, para melhor participar dele. A separação das personagens foi um recurso interessante, pois acentuou a carga dramática e, também, o sentido de individualidade e de independência. Estar sozinho representa a unicidade da experiência, já que mesmo estando com outras pessoas, a experiência é única, individual, do sujeito, percebida de forma singular e este sentido ficou muito bem demarcado quando as personagens se separam acidentalmente.

Na Ilha, mora Simão, um homem que havia se afastado da cidade e foi morar na Ilha. Ali, próximo dos animais, Simão redescobre a humanidade e Henrique participa desse momento: “Henrique nunca vira um animal chorar e ficou admirado olhando a cena.”. A voz narrativa apresenta ao leitor um Simão filósofo que questiona a conduta humana quando mata um animal:

Os caçadores não têm coração. Matam um pobre animal inofensivo pelo prazer de matar. Veja você: matar um bichinho tão inocente, tão bonito, tão delicado. Para quê? Se fosse para saciar a fome, ainda bem, mas é para se divertir que eles matam. Matam por crueldade. Querem apostar para ver quem mata melhor, quem mata primeiro. (DUPRÉ, 1973, p. 94)

A rispidez de Simão em relação a Henrique ao longo da narrativa remete o(a) leitor(a) a essa experiência negativa, vivida na cidade:

- Olhe, menino. Já vivi entre homens e sei que eles juram falso. Muitas vezes fui enganado por ele, agora não me enganam mais. Não creio em sua palavra. (DUPRÉ, 1973 p. 82)
A relação entre Simão e Henrique, a partir da convivência, vai se modificando e uma amizade começa a se formar. Neste processo, pactos de confiança, exercícios de tolerância, generosidade vão sendo construídos, tornando a jornada de Henrique um prazeroso aprendizado sobre a vida:Somente neste trecho, a narrativa leva o(a) lei r(a) à reflexão sobre as razões que levam o sujeito a tirar a vida de outro ser vivo. A assimetria entre forte x fraco como base de sustentação das relações de poder, os valores competitivos como direção para a conduta humana e a banalização da vida através da morte por diversão, aparecem como traço que caracterizam o homem urbano, o que nos remete, de certa forma, ao mito rousseauniano do bom selvagem:
-Escute uma verdade, Henrique: quanto mais culto um povo, melhor ele sabe tratar os inferiores e os animais. Isso demonstra grande cultura e você nunca deve esquecer. (DUPRÉ, 1973 p. 99)
O tom pedagógico aparece, mas de diferentes formas: através do discurso, do diálogo entre Simão e Henrique, através das práticas, do manejo das coisas, e da observação.

Existem outras questões que são tratadas neste livro que, a meu ver, é uma referência para a literatura infanto-juvenil brasileira: a fluidez da escrita, a composição dos núcleos dramáticos e a forte carga imagística do texto conferem à Ilha Perdida o status de clássico da nossa literatura brasileira infanto-juvenil.

A autora: (Botucatú 1898- Guarujá 1984)

Fundadora, ao lado de Monteiro Lobato, Caio Prado Jr. Leandro Dupré e Artur Neves, da editora brasiliense, Maria José Dupré se estabeleceu como romancista para o público adulto e infanto-juvenil. É autora dos romances Éramos Seis, Gina, entre outros.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

UMA NOVA MULHER, MARINA COLASANTI, 1980

“Sem independência econômica, não existe independência”
“Uma das grandes, embriagadoras vantagens da independência é o poder de escolha”  (Marina Colasanti)

Estava em débito com as postagens, pois estou sem internet em casa o que dificulta as atividades de blogagem.

O livro que cito hoje não é novo, foi escrito em 1980, pela escritora etíope Marina Colasanti, cujo título já aponta para uma questão de gênero, Uma Nova Mulher. A escritora apesar de não ter nascido em terras brasileiras, pois veio com 11 anos para o Brasil, transformou-se em uma das mais expressivas escritoras contemporâneas brasileiras.

Neste livro, Colasanti inicia a sua reflexão sobre a ‘nova mulher’, tematizando a questão da independência para as mulheres que foram educadas para serem esposas e mães. Através do texto Independência, que bonita que é, a escritora põe em questão a valorização do casamento pela sociedade brasileira, tornando privilegiadas as meninas casadoiras e paralelamente desprestigiadas aquelas que, embora não eliminassem a possibilidade de se casarem, não coloca o matrimônio como prioridade ou fim último:
Mas a heroína da classe não era eu. Eram as duas meninas, que desde o início do ano exibiam as suas alianças e certezas no futuro, enquanto as outras, menos afortunadas, batiam as estacas de sua segurança na escolha de um bom rapaz, namorado firme. Não era costume, não ficava bem uma moça de família pensar em independência. (COLASANTI, 1980, p. 11)
Colasanti levanta algumas questões que podem ter dado origem às confusões que permeiam os discursos, ao associar ‘dependência com carinho’. A escritora desmistifica a ideia de que ser solteira não é ser só, isolada das pessoas, alijada do exercício da afetividade e salienta a importância de romper os laços de dependência em todos os níveis, sobretudo o financeiro e o emocional. Esta ideia está articulada a outra questão que a escritora traz em seu texto, ao articular a dependência à infantilização, mostrando a tendência das mulheres dependentes em colocar a culpa nos outros: “quando a gente é independente tem mesmo que arcar com as próprias culpas, e tentar entendê-las, conviver com elas” (COLASANTI, 1980, p. 12).

A independência das mulheres é mais difícil, reconhece a escritora, por isso, deve ser alçada tendo em vista alguns aspectos: 1) maturidade financeira, pois sem dinheiro a independência não se estabelece; 2) manutenção dos laços familiares, pois o apoio da família contribui para uma emancipação menos traumática, embora a escritora reconheça que nem sempre seja possível; 3) maturidade emocional, pois, de acordo com Colasanti, pode-se ser dependente, mesmo saindo de casa, ou independente sem precisar sair. A independência é “uma forma de se colocar diante da vida”. (COLASANTI, 1980, p. 13)

A autora desmistifica ainda a ideia de uma independência relacionada ao estado civil, pois “pode-se, portanto (...) ser independente e ser casada, ou ser independente e morar com um rapaz” ou, complementando o raciocínio, embora a escritora não enuncie, ser solteira e ser dependente. Ficou no interdito, já que escrever sobre a dependência das mulheres solteiras, nos anos 80, em pleno momento de reverberação das conquistas feministas, poderia soar conservador.

Colasanti enfatiza a questão financeira como condição imprescindível para a independência, pois

Dependentes, amarradas a decisões e interesses familiares, muitas mulheres casam até hoje sem amor, apenas por conveniência, para garantir o mantenedor de papel passado. E por dependência econômica, por não saber, poder ou querer prover a si mesmas, um número assustadoramente grande de mulheres se mantêm presas a casamentos errados, dolorosos e às vezes até humilhantes. (COLASANTI, 1980, p. 14)
Logicamente que naquele momento, as mulheres da geração de 60, quase todas casadas ou divorciadas, vão focalizar as relações familiares, que dão sustentação à assimetria de gênero, um dos alicerces do patriarcado.

Colasanti desmistifica também a questão da profissionalização, mostrando que ter uma profissão não garante a independência, embora seja importante para dar acesso a segurança financeira. O que a escritora defende é o conhecimento de mundo, isto é, “saber em que mundo se vive, quem são as pessoas que nos rodeiam, quais são os grandes questionamentos do ser humano (...) são os conhecimentos que dão à nossa independência uma arquitetura mais sólida” (COLASANTI, 1980, p. 15). Neste sentido, a autora mostra que é importante saber resolver pequenos embaraços cotidianos, como trocar pneus, botar uma bucha na parede, ainda que as mulheres não precisem necessariamente executá-los,

mas é um descanso saber que se for preciso a gente mesma faz, sem ter ficar apatetadas à beira da escada ou na porta de casa, esperando que um homem salvador caia dos céus para resolver estes problemas “insolúveis” (Idem, Ibidem)
Uma mulher independente, segundo Colasanti, não pode ser passiva, vir “à reboque de alguém”, o conhecimento é fundamental para que os assuntos, fruto do diálogo entre o casal, sejam abalizados a partir dos dois pontos de vista. É importante que se diga que o leitor ou leitora de interesse da escritora é o da classe média, a qual ela pertence, e que, em razão disso, a questão do casamento ainda é um objetivo de muitas, não se cogitando, por exemplo, outros arranjos conjugais. Para Colasanti, o problema está ainda na mulher que vê a profissão como uma passagem, não vê como carreira, com uma visão de futuro e de inserção social. Algumas mulheres deixam de trabalhar quando se casam, reforçando a ideia do trabalho como exercício para as mulheres solteiras. O casamento passa a dar acesso à prática de diferentes profissões: arrumadeira, camareira, cozinheira, lavadeira, enfermeira, decoradora, costureira, bordadeira, entre outras, em troca a mulher gozaria do status de esposa, herdeira da metade do patrimônio (se tiver filhos), após a morte do marido, mas correndo o risco do divórcio que a atrelava à pecha de mulher lúbrica, por isso a sua conduta teria de ser enquadrada ao sistema.

Concluindo o seu texto, Colasanti se reporta a algumas falas que circulam na sociedade, oriundas dos medos dos homens da mulher independente e a cada um delas a autora descarta a possibilidade da mulher vir a se interessar pelos perfis de homens que se apresentam.

1) Os homens que temem a concorrência. “que a mulher nenhuma deve interessar”.
2) Os homens que temem a liberdade da mulher ir e vir. “quem os quer?”
3) Os homens que temem a mulher liberada sexualmente. “E estes para que servem?”

A autora ainda provoca a sua leitora (ou leitor) dizendo que a independência traz benefícios à mulher porque funciona como “peneira”, isto é, ajuda a selecionar os parceiros conjugais. Por fim, a propaganda chega a ser metaforizada em linguagem de mercado: a escritora, uma das consumidoras, testemunha a eficiência do produto, a independência, e ao contrário de um vendedor, ela não detém o produto, mas nos informa que “ele é acessível, nacional e está bem ao alcance de cada uma”. (COLASANTI, 1980, p. 18-19).

Em pleno backlash, momento pelo qual passamos atualmente, quando vemos algumas performances conservadoras nas práticas sociais, vale a pena resgatar os textos das escritoras da geração de 60, pois eles foram importantes tanto do ponto de vista literário quanto pedagógico, servindo como ponto ou contraponto no processo dialógico da leitura.

Questões salientadas por Colasanti ainda podem ser sentidas hoje na vida de muitas mulheres, independente da classe social. A dependência econômica e emocional ainda é um entrave a ser superado diariamente, atrasando o processo de desenvolvimento da mulher. A mídia, a literatura, enfim, os discursos que operam com o simbólico podem libertar as mulheres das ciladas de gênero ou podem trancafiá-las eternamente, limitando-as e reduzindo-lhes a existência humana. Uma mulher dependente não experimenta as suas potencialidades humanas porque nunca ultrapassa os limites estipulados para ela, e o pior é que elas acabam se convencendo de que a vida é assim mesmo: se asas, sem vento, sem horizontes.